Lembra que Cisne Negro não é um filme de ballet mas sim um filme sobre uma bailarina?
Guerra Civil não é um filme de guerra (ou sobre polarização) mas sim um filme sobre jornalistas que cobrem guerras.
Isto posto: PUTA FILME!
Isto posto 2: Alex Garland é Deus, desde sempre. E continua sendo.
Só tirei meia claquete da nota máxima possível porque o roteiro é um pouco telegrafado demais pro meu gosto. Se ele tirasse 3 cenas do início do filme ou se ele mudasse um detalhezinho do final, Guerra Civil seria daqueles que grudariam no meu coração pra sempre.
Não que não vá grudar, mas sempre vai ter o senão desse pequeno detalhe do roteiro telegrafado. Sem spoilers, claro.
O filme é sobre um casal de jornalistas, a fotógrafa de guerra super renomada Lee Smith (Kirsten Dunst indicada ao Oscar e provável vencedora) e seu companheiro Joel (Wagner Moura indicado ao Oscar de coadjuvante), um jornalista também de guerra.
Sua missão é atravessar os Estados Unidos em guerra civil para entrevistarem e fotografarem um presidente que adora arminhas e fala de Pátria e família, bem fascistóide, no que eles dizem estar em seus últimos momentos.
A gente vê seu carro atravessando o que restou dos EUA depois da super polarização que dividiu o país em vários. E ao que parece um pior que o outro.
Junto com o casal vai Sammy (o maravilhoso Stephen McKinley Henderson) um jornalista das antigas, mentor de Lee e meio que o grilo falante, a voz da sabedoria da viagem.
De última hora eles também levam Jessie (Cailee Spaeny, a Priscilla do Elvis da Sofia Coppola), uma fotógrafa novata que venera Lee Smith e quer aprender tudo com a veterana.
Pelo caminho eles encontram toda sorte de gente desgraçada que ou está de um lado da história ou do extremo oposto, para o bem ou para o mal e que podem (ou não) ver as figuras de jornalistas como vendidos ou heróis ou pior ainda, dependendo de onde essas pessoas nasceram, nem os consideram “americanos de verdade”.
Mais do que a guerra, como falei lá em cima, Garland nos mostra o quanto o trabalho desses caras é essencial para o nosso dia a dia, o quanto eles precisam ser isentos, o quanto eles tentam ser e o quanto não necessariamente eles conseguem o tempo todo.
Guerra Civil pode até ser considerado um retrato de nosso tempo mas não só porque acho que desde sempre jornalistas são vistos com um pé atrás. E como sempre digo, filmes sobre jornalistas, sobre repórteres e suas matérias incríveis nunca são bons.
Mas esse aqui é, porque não é sobre uma matéria em si, como Cisne Negro não é sobre o ballet oou sobre a bailarina dançando aquela peça em si.
Guerra Civil é sobre como pessoas vivem, sentem, amam e principalmente sobrevivem numa situação extrema que não termina.
Quando eles chegam numa cidadezinha onde as lojas funcionam, as pessoas passeiam na rua, eles entram em uma loja e perguntam se a vendedora sabe que o país está em guerra e ela diz bem calma “sim, nós sabemos, mas tentamos não pensar nisso para não entrarmos em desespero”.
Certa ela, errada está a Bíblia, como diria minha avó.
Será que o certo não seria fazer como acontece em The End We Start From, onde um casal com filho recém nascido vai pra casa dos pais no interior esperar a guerra iminente acabar?
Em Guerra Civil o certo é ir pro meio do fogo cruzado, aprender a enxergar a pessoa-bomba chegando no meio de uma manifestação, enxergar o povo bem doido de longe, desviar, se proteger e proteger os seus próximos, ter sangue frio pra conseguir a melhor foto, a melhor história e não morrer tentando.
Alex Garland, um dos meus diretores e roteiristas preferidos, aqui é cirúrgico ao contar essa história, criou essa distopia maluca mas bem provável que a gente assiste e acha que é um documentário e agradece por ser só uma ficção.
NOTA: 1/2