Aki Kaurismäki, pra deixar tudo claro de partida, é um dos meus diretores preferidos da vida, desde que assisti na Mostra de São Paulo, lá por 1989/90 o mockumentário maravilhoso que é sua estreia, pra mim, oficial na direção Os Caubóis de Leningrado Vão Para a América, onde ele não só cria um universo totalmente particular como nos faz acreditar que aquele universo onírico, surreal e maximalistamente bizarro era real.
Falar de seu filme novo, Folhas de Outono, que saiu de Cannes em 2023 com o Grande Prêmio do Juri, estar em quase todas as listas de melhores filmes de 2023 e ser o candidato da Finlândia a uma vaga ao Oscar 2024, é um prazer pra mim.
Aqui ele mais uma vez cria um universo só dele, já que o filme se passa em 2022/3 mas esteticamente temos cenários e figurinos e direção de arte que remetem aos anos 1950 e a direção de elenco parece que veio diretamente de um filme perdido de David Lynch que se passa no país dos amantes sem paciência.
E fim.
Mentira, mas poderia terminar a resenha por aqui já que é quase isso tudo o que importa saber de Folhas de Outono, o que realmente faz essa aspas comédia romântica aspas acontecer e nos deixar sem chão.
Pois é, mais uma vez Kaurismäki nos ilude, nos engana, nos faz acreditar que ele é um cineasta super cabeça quando na verdade ele é um melodramático incontestável, um diretor que gosta de amorzinho e final feliz. Claro, final feliz nos universos que ele cria, não necessariamente no nosso de espectador.
Aqui vemos Ansa, uma mulher solteira que trabalha em um super mercado, em uma saída para beber com as amigas em um karaokê, se interessa por Holappa, um metalúrgico alcoólatra que mora onde trabalha e também sai pra beber com os amigos, além de beber o dia inteiro.
Acontece que, olha só, o destino resolveu dar uma atrapalhadinha em seus planos, fazendo Holappa perder o número de telefone de Ansa, sem mesmo saber o nome da bonitona e agora eles dependem do destino para se reencontrarem.
Não é o enredo mais de comédia romântica fofa possível?
Seria se não fosse a pobreza, a vida besta que ambos levam, a falta de perspectiva, ou melhor, a única perspectiva que tinham talvez fosse um no outro e o vento a levou embora.
Mas Kaurismäki é nosso pastor e nada nos faltará com sua genialidade, seu roteiro maravilhoso, seu jogo recriar o romance em um universo colorido e lúgubre, triste mas esperançoso, já que sempre há uma luz no final de seus quadros, de suas cenas.
Mas o que me pegou de frente foi a falta de paciência mesmo de seus personagens, a frieza com que eles lidam com os acontecimentos mais esdrúxulos do dia a dia e talvez a consciência do que eles sejam na vida que eles levam e que seus sonhos não sejam tão fora de suas possibilidades reais, o velho e bom “não crie expectativas”.
No final das contas Folhas de Outono é a comédia romântica do anti herói, das personagens pra quem a gente aprendeu a não torcer a favor, a não ter nenhum tipo de afeto ou nada parecido. Mas esses são sempre os nossos preferidos.
NOTA: