Quando fui ontem assistir Assassinos da Lua das Flores, o novo Scorsese, juro que fiquei com um pé atrás pelas 3h40 de duração.
Ao final eu queria outras 3h40 de filme.
Eu sou bem leviano afirmando sempre aqui no blog verdades sem muita reflexão, por vezes e aqui vai mais uma: Assassinos da Lua das Flores é o melhor filme do diretor que nos deu Taxi Driver.
Outra: Scorsese é o melhor diretor vivo daquele país conhecido como Estados Unidos.
O que ele fez neste filme me deixou mais chocado do que o normal que fico quando assisto seus novos lançamentos.
De cara, como o Scorsese é grande e seus filmes vão direto para os Oscars, cravo aqui que Assassinos da Lua das Flores vai ser facilmente indicado a melhor: filme, diretor, atriz principal, ator coadjuvante, ator tb pelo lobby Dicapriano, fotografia do mexicano Rodrigo Prieto, montagem, roteiro, trilha do Robbie Robertson, que morreu 2 meses antes do filme ser lançado e Scorsese o dedica ao amigo músico.
No melhor dos mundos, Assassinos da Lua das Flores venceria os top 5 (filme, diretor, roteiro, ator e atriz), feito que nnao acontece desde O Silêncio dos Inocentes e que todo mundo, eu inclusive, acha impossível que acontecesse de novo.
Até que Scorsese acerta na mosca. Na. Mosca.
O filme conta um dos casos mais horrorosos da história dos Estados Unidos, o genocídio do povo Osage em Oklahoma que na década de 1920 descobriu petróleo em suas terras e lá se tornou o povo mais rico do mundo per capita.
Como o homem branco é uma desgraça e o homem branco nascido nos EUA é o pior possível, eles criaram leis que de uma forma ou de outra fizessem com que os Osage, para usarem seu dinheiro, tinham que ter um tutor branco que cuidasse desse dinheiro todo porque os “índios” então foram considerados incapazes. Pensa no horror. História real.
Para piorar, os brancos começaram a se casar com as mulheres Osage, a ter filhos com elas e aos poucos iam matando essa mulheres e seus familiares para garantirem a fortuna toda para eles. História real.
Tudo isso e muito mais está no filme violentíssimo, como eu não esperava de Scorsese, em um roteiro brilhante que ele escreveu com o grande roteirista Eric Roth, baseado em um livro e o mais legal, com consultores Osage, que no final das contas detonaram em partes o filme dizendo que a histórias não é contada a partir do ponto de vista do povo Osage mas sim, claro, do homem branco.
Leonardo Di Caprio é Ernest, sobrinho do pecuarista milionário e tutor de vários Osages, William King (De Niro de novo surpreendente) que paga de amiguinho dos indígenas mas que na verdade só quer suas terras e suas fortunas. King aproveita que Ernest acabou de chegar a suas terras com uma mão na frente e outras atrás e ficac colocando na cabeça do sobrinho qu ele deveria namorar Mollie, uma mulher linda, de uma das famílias Osage com mais terras e posses do lugar.
O romance começa, eles se casam e aos poucos King vai mostrando ao sobrinho quem ele realmente é e como faz para ter cada vez mais a posse de tudo ao seu redor.
Sim, esse é o caminho do genocídio lento e (quase) silencioso, travfestido de tragédias e coincidências ruins onde as mortes das pessoas do povo Osage nunca são investigadas como deveriam pela polícia, adivinhem porque.
A cidade onde se passa o filme é muito peculiar, parece saída de um filme de ficção científica distópica onde os indígenas são os donos de tudo milionários e os brancos são os serviçais, motoristas, vendedores, mas não sem se aproveitarem como podem, por exemplo, cobrando sempre muitas vezes mais seus serviços dos Osage o que cobrariam dos seus.
Todos esses e muitos, mas muitos outros detalhes nos são mostrados por Scorsese que faz questão de jogar na nossa cara que nada é por acaso e que a nossa audiência ali acaba sendo cúmplice dos horrores cometidos décadas atrás pelo simples fato de não sabermos do que aconteceu, o que é um absurdo porque historinhas muito mais irrelevantes tiveram incontáveis adaptações ao cinema e um horror da vida real como este ou como o massacre de Tulsa também nos anos 1920 é solenemente “esquecido”. Na verdade apagado da história.
Eu ia assistindo o filme e imaginando como Scorsese terminaria essa saga de morte e desespero e nada me preparou para o que eu vi que obviamente não vou contar aqui por motivos de não damos spoiler.
Eu falei do DiCaprio e do De Niro mas tenho que falar da verdadeira estrela de Assassinos da Lua das Flores, a inacreditável LiLy Gladstone que vive Mollie, a Osage que se casa com Ernest por amor, a milionária que tem medo de comer a comida de sua própria casa ao ver que sua família, sua mãe e suas irmãs, vão morrendo como folhas secas no outono.
Lily criou uma personagem forte ao mesmo tempo que está tensa, nervosa, o tempo inteiro. Ela, como todos os outros Osage, acham que tem consciência do que está acontecendo com seu povo mas não sabem da missa um terço mesmo com as pessoas morrendo, com casas explodindo e com a inutilidade policial em relação a esses casos.
Lily talvez seja a atriz com personagem que mais sofre do ano, ela dá 2 ou 3 sorrisinhos no filme, não por não saber sorrir, mas por saber que não adianta sorrir, que seu futuro já está escrito e ela tem que agradecer por ainda estar viva.
Eu torço para Greta Lee de Vidas Passadas vencer todos os prêmios de interpretação possíveis mas com Lily Gladstone e sua Mollie na parada, a coisa vai ficar difícil. Isso sem falar de outra preferida que é Teyana Taylor de A Thousand and One.
Acho que deu pra entender o meu amor por Assassinos da Lua das Flores, pelo Scorsese de 2023, pela Lily Gladstone (que pode ser a primeira indígena a ser indicada ao Oscar) e pelos filmes de gente grande (mesmo custando 100 milhões de dólares neste caso, o que eu acho um horror).
NOTA: