Caros Camaradas: Trabalhadores em Luta é o filme russo candidato a uma vaga para o Oscar de melhor filme internacional.
O filme dirigido pelo grande e divo Andrei Konchalovsky me fez sentir saudades desse diretor que foi tão atuante nos anos 1990 e que ultimamente vem fazendo filmes com espaços maiores de tempos entre um e outro.
Caros Camaradas é um drama histórico baseado no que é conhecido hoje como o Massacre de Novocherkassk, quando em 1962, trabalhadores de uma fábrica dessa cidadezinha então soviética, se levantaram contra o partido comunista, carregando faixas e cartazes com a foto de Lênin, olha que abuso, contra quem não parava de aumentar os preços de tudo, principalmente dos alimentos, sem assumir que o país passava por uma recessão.
O que todos sabiam que aconteceria, mas mesmo assim pagaram pra ver, é que o governo mandaria o exército para acalmar os ânimos dos trabalhadores da fábrica que foram acompanhados por mais de 5 mil outros trabalhadores de cidades vizinhas e que juntos foram executados pelo que se sabe hoje, snipers espalhados pelos prédios em volta da praça pela KGB, a temida polícia federal soviética.
Lyuda (a maravilhosa Julia Vysotskaya, vencedora do prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza de 2020 por esse papel), uma funcionária da prefeitura local, pertencente ao Partido Comunista, que achava que o exército deveria sim metralhar os amotinadores, logo muda de percepção geral quando, primeiro vê um dos snipers no prédio da prefeitura e depois tem que lidar com o desaparecimento de sua filha e descobre que os corpos dos assassinados são levados para longe da cidade.
Além disso, o partido manda que o terreno da praça seja imediatamente recapeado, já que o sangue ficou impregnado no asfalto.
Se não pudermos limpar, que o apaguemos como pudermos, diz um oficial em certo momento.
A história toda seria um absurdo se não tivesse acontecido em plena guerra fria, quando a União Soviética estava mais perdida que nunca, pós Stalin, tentando crescer em meio a essa recessão toda.
E Konchalovsky filma essa história da forma mais linda possível, com uma câmera que em princípio deveria estar escondida, mas que seus personagens sabem exatamente onde ela fica e pra onde está apontando e por ela dança como em uma balé ególatra, como se nos dessem sorrisinhos amarelos de canto de boca mandando mensagens “ei, eu sei que vocês estão me assistindo mas nem por isso eu vou fingir, a parada aqui é séria”.
Caros Camaradas está longe de ser o filme chapa branca que poderia ter se tornado e por isso mesmo se torna uma experiência obrigatória de como o cinema pelas mãos de um Autor (com A maiúsculo mesmo), de um cara que escreve, dirige e produz um filme desse nível só pode ser adorado e idolatrado salve salve Konchalovsky.
NOTA: