A aula da disciplina de Narrativa Transmídia e Mídias Locativas foi focada em conceitos e exemplificações que envolvem o tema “Transmídia e Mobilidade”
Uma das características principais das sociedades imergidas em redes é a tendência para a ubiquidade. Deste modo, é possível imaginar que a tendência à presença da internet nos mais diferentes tipos de objetos e dispositivos é uma demonstração iconográfica do funcionamento do capitalismo e dos modos de produção em geral, cujas interligações de formato rizomático (ou seja, em que é difícil encontrar o início e o fim das intersecções) estão sendo transportadas para os mais distintos campos da sociedade.
[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=dQLfmTgXDVM]As redes, conectadas através de dispositivos com ou sem fio formam, portanto, uma camada informacional de realidade em cima do mundo “real” como conhecemos. Através de dispositivos como smartphones – ou seja, celulares com alta capacidade de computação de dados, conectividade e possibilidade de produção e consumo de conteúdo imagético e sonoro -, tablets, notebooks, netbooks e outros dispositivos que se conectam à internet, é possível notar várias novas formas de organização e criação de dados e mudanças comportamentais/cognitivas:
Mudanças cognitivas no consumo de conteúdo e no trabalho: as telas de tamanho pequeno ainda são entraves para o consumo de vídeos e filmes para os consumidores final. Entretanto, é possível notar mudanças graduais nos espectadores, que estão se acostumando a assistir televisão, vídeos e consumir imagens nos dispositivos móveis. É um fator difícil de ser julgado, e representa a esquizofrenia e contradição do sistema capitalista: por um lado aumentam-se as possibilidades de consumo de conteúdo (é possível assistir televisão, ver notícias, fotos etc). Por outro, a conectividade ubíqua e presente em grande parte dos locais e em grande parte do tempo do usuário pode ser escravizadora, gerando a necessidade constante de produção e consumo de conteúdo; além do possível aumento da jornada de trabalho, visto que o usuário de tais dispositivos pode ser facilmente encontrado fora de seu horário “oficial” do emprego – em outras palavras, com o celular, o usuário pode levar o trabalho para casa.
Voltando a descrever as mudanças cognitivas e psicológicas do consumo de narrativas e histórias em dispositivos móveis, tem que se destacar que novas tecnologias produzem novas formas de contar, produzir e participar de histórias. Os aplicativos móveis, softwares desenvolvidos para celulares, tablets, players de áudio com tela de toque, etc., juntamente com as capacidades tecnológicas de tais aparelhos, como geolocalização (GPS e cruzamento de dados de antenas que mostram a localização do usuário), acelerômetro (sensor de movimentação do usuário), bússola, câmeras, microfones, dentre outros, são capazes de produzir narrativas sinestésicas e colaborativas. Um exemplo é o aplicativo “Dimensions”, um jogo em que o participante, usando fone de ouvido, produz camadas sonoras em cima da camada “real” do som, tentando emular experiências psicodélicas e dimensões paralelas. Necessidades de movimentação, de estar em um determinado local (captado pela captura do GPS), de criação de fotos e de produção de sons através dos microfones fazem com que o usuário seja recompensado com novas fases e novas formas de construir histórias (que não são narrativas clássicas, mas sim conjunções de elementos caóticos capazes de gerar experiências cognitivas sinestésicas). A descrição de um objeto de estudo como esse é complicada, é necessário sentir e ver apresentações para compreender as totais capacidades de interação. Segue o vídeo abaixo:
[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=7-caFZJ1-oM]O conteúdo televisual disponível em telefones celulares pode ser considerado ‘televisivo’ ou é transformado pelo contexto de visão e de tecnologia da plataforma para o ponto onde ele deve ser reconstruído como qualquer outra coisa? (EVANS, 2011, P.117)
Geolocalização e Geotags: Aplicativos que cruzam os dados de geolocalização como o Foursquare, ou aqueles que permitem que marcações sejam feitas em cima de vídeos e imagens captadas por smartphones e tablets são capazes de criar uma nova camada de realidade em cima de locais frequntados pelos usuários destas tecnologias. Essa nova camada de realidade é uma meta-camada, pois em grande parte são comentários sobre os lugares, como dicas aos consumidores de determinadas lojas. A marca de cervejas Stella Artois fez um aplicativo usando as possibilidades de geolocalização e marcação que permite que os apreciadores da bebida marquem bares que possuem o produto, façam comentários sobre eles, criem vídeos e fotos podendo contar histórias através da plataforma. Ao passar o celular por perto desses bares, o aplicativo detecta as marcações e histórias em vídeo das coordenadas geográficas e mostra a camada de “realidade” criada.
[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=sTERI1s-UyA]Ativismo digital – É fato que os dispositivos móveis com capacidades descritas neste artigo são partes de interesses de grandes companhias e podem ser utilizados para passar mensagens revolucionárias, como aconteceu na Primavera Árabe em que as redes de dispositivos móveis ajudaram a promover manifestações que combatiam regimes totalitários (havemos de nos perguntar o quão totalitários são os novos regimes, e o quanto de outros tipos de totalitarismo e preconceito estão embutidos no imaginário coletivo dos ocidentais também – esquizofrenias do capitalismo). Resta usar as ferramentas dadas para criar linhas de fugas e histórias que transpassem os interesses econômicos e visem o bem-estar. O risco de subverter uma sociedade de controle, em que somos vigiados e estamos nos acostumando a sê-los, ainda que incoscientemente, é o de que as subversões sejam novamente devoradas pelo sistema capitalista. Possibilidades como as dadas pelo Anonymous fazem com que o aspecto partidário e burocrático das relações de poder tendam a serem deixados mais de lado (ainda que seja impossível fugir de tais influências).
[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=26PLBeABDZ0]BIBLIOGRAFIA (os conceitos estão espalhados pelo texto acima):
BEIGUELMAN, G. e LA FERLA, J. Nomadismos Tecnológicos. São Paulo: Senac, 2011.
CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 199
DELEUZE, G; GUATTARI, F. Mil Platôs. São Paulo: Editora 34, 2002
EVANS, E. Transmedia Television: Audiences, New Media, and Daily Life. Nothingham, UK: Routledge, 2011.
LEMOS, A. Cultura das Redes. Salvador: EDUFBA, 2002
LEMOS, A. Cultura da mobilidade. Revista FAMECOS, Porto Alegre, n. 40, p.28-35, dez./2009.
MURRAY, J. Hamlet no holodeck: o futuro da narrativa no ciberespaço. São Paulo: Unesp: Itaú Cultural, 2003
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