Juro que eu queria entender o porque dos mexicanos não gostarem de Emilia Pérez e gostarem de um filme como Sujo.
Veja bem, Sujo é um baita de um filme sobre um filho de sicário, filho de bandido de cartel de drogas.
Mas eu também acho Emilia Pérez um filmão. Só que é sobre um chefão de um cartel de drogas que resolve “virar” mulher.
Daí vem minha questão: será que a tal da transfobia que acusam EP não vem mesmo dos mexicanos, que não querem se ver retratados como uma travesti traficante?
Sujo é o nome do menino filho do 8, um funcionário do crime, um sicário, que é morto pelo próprio tribunal do crime deixando seu filho de 4 anos de idade para ser cuidado pelas tias, uma delas conhecida como bruxa, porque vive no meio do mato… como uma bruxa.
Ele vai crescendo bem cuidado, com vontade de estudar mas claro que é cooptado pelo cartel que seu pai trabalhava, um cara violento, lendário, admirado por alguns e odiado por outros que sofreram em sua mão. Inclusive eles já tem até um apelido para Sujo, que começa a fazer servicinhos mais “fáceis” e básicos para começar a aprender como tudo funciona.
Sujo é um moleque de futuro vivendo em um mundo sem futuro, uma história que se passa no México mas que muito bem poderiam se passar no Brasil onde a gente vê em jornais televisivos sobre o menino que vive no meio do fogo cruzado do tráfico e que tem 2 opções de futuro: ou ele se salva com a ajuda da professora que enxerga nele alguém que está nesse mundo do crime por acaso ou por falta de perspectiva ou a gente vê num obituário sobre mais um adolescente que se vai, morto no fogo cruzado.
Quando perguntei ali acima qual era a diferença deste filme com Emilia Pérez, ou as semelhanças, foi uma piada boba, uma provocação.
Emilia Pérez é a banalização da violência, a espetacularização da desgraça alheia, realizada por alguém que vê toda essa desgraça de fora, de longe, e tem a “brilhante ideia” de transformá-la em um musical da Broadway, usando vários signos moderninhos com a certeza de que não teriam coragem de falar mal de um filme estrelado por uma atriz trans vivendo uma personagem trans. Mas as coisas não são bem assim no mundo real onde a desgraça de uns milhões pode ser a diversão de outros.
Sujo tem uma dedicatória de cortar o coração, o que explica a superioridade até ética deste filme em relação ao musical francês.
Sujo é dedicado “aos órfãos deste país em chamas”, o que explica mais que o filme, explica o desespero, a falta de perspectiva, o cansaço de um povo brilhantemente retratado no filme, que prefere mesmo sem ter dinheiro para comprar comida prefere destruir um carro que ganhou mass que foi usado para o tráfico.
É o menino que rouba a casa da mulher que o ajuda mas não rouba tudo, esconde a carteira da mulher para seus companheiros só levarem o celular e o aparelho de som.
É a bruxa que faz o que pode e o que não pode, até por não ser bruxa, para que seu sobrinho que ela cuida como filho, não tenha uma tatuagem no peito com um número, como seu irmão sicário e pai do menino tinha, e por isso morreu.
Sujo é o filme da desesperança mas com o desejo, mesmo achando que seja quase impossível, que apareça a professora que enxergue essa esperança perdida no meio das cinzas, da escuridão, da violência e da desgraça.
NOTA: