O paquistanês Joyland, vencedor da Palma Queer do Festival de Cannes de 2022 é um dos filmes mais sensíveis e mais brasileiros que assisti este ano.
Sim, Joyland é um filme que por momentos eu ficava esperando os personagens falarem português, quando eles falavam punjabi.
O filme gira em torno de uma família Rana onde os irmãos, suas esposas e filhas, vivem juntos na casa de seu pai já viúvo.
E neste microcosmo patriarcal eles aguardam a chegada de um neto para dar continuidade ao nome da família honrosamente, como eles dizem no filme.
Haider, o filho mais novo, está desempregado enquanto sua esposa Mumtaz trabalha como maquiadora e está economizando dinheiro. Ela diz que é porque está tentando engravidar, mas na verdade ela quer comprar um ar condicionado pra casa deles.
Depois de muito procurar, Haider consegue um emprego no teatro, para ser bailarino em um show de uma artista trans, Biba, uma cantora talentosíssima e linda, que fica com os piores horários dos shows, apesar de ser melhor que a outra cantora.
Haider não sabe dançar, mas não pode negar um emprego que pague razoavelmente bem. E apesar da vergonha de ter que dançar no palco, ele aceita mas diz à família que vai trabalhar como ajudante de produtor.
O que ele nem ninguém esperava era que ele se apaixonaria por Biba.
E que essa paixão fosse linda e bem reveladora para Haider.
Só que o que a gente vê nessas relações todas entre ele e sua esposa, seu pai, seu irmão e sua namorada secreta, não é nada do que esperamos.
O filme parece um Teorema do Pasolini às avessas.
Lá, uma família tradicional era destruída por um homem lindo que apareceu do nada.
Aqui, a família tradicional transforma a vida da cantora trans sem que também ela perceba.
O roteiro de Joyland é de uma delicadeza e originalidade incríveis. O autor e também diretor Saim Sadiq faz sua estreia acertando um gol de placa, dando vida a suas personagens num universo cru, pé no chão, ao mesmo tempo que é onírico.
Joyland parece que foi filmado em algum rincão no interior do Brasil, em algum meio do nada daqui.
Até poderia dizer que é um primo próximo de Deserto Particular mas o filme vai além.
Eu terminei de assistir Joyland e parecia que eu tinha assistido um filme de 6 horas de duração, de tanto que eu me senti íntimo de seus personagens, de tanto que eu entendia como todo mundo lá se comportava, mesmo me surpreendendo bastante o tempo todo e ficando maravilhado com o final.
NOTA: