Lapsis é um dos filmes mais doidos e mais bacanas que assisti ano passado no Fantasia Festival.
O filme é uma ficção científica distópica bem/mal humorada que mostra de uma forma bizarra o que estamos sofrendo nesse nosso mundo onde passamos de consumidores para prosumidores e achamos bacana.
Explico.
Até bem poucos anos atrás a gente era consumidor, gente que vivia para trabalhar para pagar contas e sobreviver.
E com o pouco que sobrava a gente consumia despudoradamente.
Com as mídias sociais chegando no nível que chegaram, hoje em dia a gente além de pagar para consumir, a gente produz conteúdo de graça para essas marcas que a gente tanto ama e dá nosso suado dinheiro. Em troca de migalhas.
Exemplos óbvios: Uber e AirBnB.
Essas 2 “empresas” gigantes e bilionárias apareceram da mesma ideia genial: arrumar mão de obra barata que trabalhe para eles, que não tenha vínculos empregatícios, que produza e crie e cuide e se vire e que pra tudo isso, ganhem uma porcentagem pré estabelecida que ao final de contas é quase nada em relação ao que os donos ganham, claro.
Só que ao invés de você ir trabalhar no escritório da Uber, pegar um carro deles e dirigir o dia todo e se quebrar eles arrumam e a gasolina quando acaba eles abastecem, você usa seu carro e se vira.
Ou sua casa ou seu apartamento, no caso do Airbnb, ao invés do cara construir um hotel ou uma pousada, porque afinal o empresário não precisa ter tanto trabalho assim.
Em Lapsis, as pessoas em um presente paralelo tão ruim quanto o nosso, são contratadas para esticarem cabos que serão usados em comunicação, por exemplo, trabalho barato que fica mais barato ainda do que se feito por robôs ou funcionário contratados.
Lapsis é o uber da expansão da comunicação, com promessas de muito dinheiro a ser ganho, de trabalho fácil e barato para ser feito no seu tempo livre.
Só que não é bem assim.
Na verdade não é nada assim.
Se Lapsis subisse um tom, seria um filme de horror do desespero.
Se subisse outro tom, poderia ser um suspense policial oriental.
Mas pelas decisões acertadas do diretor Noah Hutton (filho dos divos Debra Winger e Timoty Hutton), o filme parece uma paródia bem humorada, mas no fundo é um tipo de parábola de George Orwell em tempos de tecnologia pessoal que deu muito certo mas que no fim acaba sendo uma grande roubada.
O elenco do filme é perfeito, caras e corpos totalmente estranhos a uma ficção científica em uma história também não muito usual, principalmente com a forma que é contada.
O filme poderia ter sido dirigido pelo doido francês Mr. Oizo, de tão no limite do bizarro e da comédia que fica, mas que tendo sido feito pelo ótimo Hutton mostra que uma possível onda não surreal, mas talvez hiper real, possa estar vindo por aí, pelo menos no cinema.
Um dos imperdíveis.
NOTA: