Pieces of a Woman é um dos filmes que eu mais estava ansioso pra assistir dessa safra por tudo o que vinham dizendo dele, pelo prêmio de melhor atriz no Festival de Veneza para sua estrela Vanessa Kirby e principalmente por ser o primeiro filme nos EUA do ótimo diretor húngaro Kornél Mundruczó.
O filme tem um dos melhores inícios dos últimos (vários) anos onde em um plano sequência de quase 30 minutos (aquelas tomadas sem cortes, onde a câmera mostra exatamente o que temos que ver) vemos Martha (Kirby) dando à luz sua filha em casa, com a ajuda de seu companheiro Sean (Shia La Beouf) e de uma parteira que de última hora substituiu a que o casal havia contratado.
O que começa com aquela tensão normal de um parto, das contrações e dores que Martha vai sentindo e que vão aumentando, de repente alguma coisa sai da ordem normal e tarde demais a parteira manda Sean chamar uma ambulância porque a criança está com sérios problemas. Foco no tarde demais.
Tudo isso antes dos créditos iniciais do filme, deixando bem claro que ninguém está ali para aliviar nada para o público.
O que era pra ser um belo de um drama logo de cara se transforma em um filme de horror da vida real, como eu gosto de chamar, onde desgraça pouca é bobagem.
O diretor Mundruczó nos mostra em vários lindos e muito bem dirigidos planos sequências pelo filme que Martha não só não se recuperou do baque inicial como não está preparada para lidar com as pessoas a sua volta, nem com seu companheiro e muito menos com sua mãe e sua irmã.
A vida de Martha é virada de cabeça para baixo. Ou melhor, a cabeça de Martha, sua alma e seu coração são virados de cabeça para baixo.
Em Pieces of a Woman nós enxergamos o quanto uma perda traumática extrema acaba com alguém, por mais forte que esse alguém seja. Por mais apoio e carinho que Martha receba de seus próximos, nada é suficiente para aplacar o que se quebrou para sempre dentro dela.
Pieces of a Woman é um “tour de force” de 2 horas comandado por uma Vanessa Kirby mostrando a que veio, mostrando a grande atriz que já é, que nas mãos do diretor certo com um roteiro perfeito, deita e rola na frente da câmera.
A partir de um momento do filme, que foi logo depois do início “punk”, eu já queria estar de joelhos venerando Martha/Vanessa em sua via crucis com coroas de espinhos, uma sobre a outra, a fazendo chorar sangue pela testa sem derramar uma única lágrima quando deveria quebrar tudo e gritar até perder a voz.
Claro que Vanessa não está sozinha no filme e tem a sua volta o melhor elenco possível, com um Shia tosco e ogro perfeito e com a musa Ellen Burstyn como a mãe judia, controladora, inepta e ineficaz, sem um pingo de “sororidade” pela filha destroçada, só pensando como a família pode resolver as coisas, mesmo que seja com um cheque polpudo que funciona e varre a sujeira para debaixo do tapete.
Todos torcem para Ellen ser indicada e vencer o Oscar de atriz coadjuvante (eu ainda torço pela Sônia Braga em Bacurau), mas uma única certeza que tenho é que Vanessa vai brigar pesado pela estatueta, no mesmo nível de outras 2 certezas que são Carey Mulligan em Bela Vingança e Frances McDormand em Nomadland.
Vá na Netflix, respire bem fundo e dê o play nesse petardo. É um soco no estômago que lava a alma.
NOTA: 1/2