Bloody Nose, Empty Pocket é um filme em princípio meio besta, com uma ideia que em princípio só funcionaria para “iniciados”: um documentário sobre o último dia de funcionamento de um boteco bem trash em Las Vegas.
Confesso que só assisti porque eu já tive um bar preferido na minha vida, o Director’s Gourmet, um boteco cheio de personalidade e dos mais ecléticos possíveis, onde lá estive no dia da inauguração e só não fui ao último dia de funcionamento, 20 e tantos anos depois, por motivo de força maior.
Por causa da saudade do Gourmet, da melancolia por não ter ido ao encerramento, encarei de frente esse documentário e a cada corte de cena eu fui me deixando levar pela melancolia de seus personagens, pela tristeza pré-estabelecida por ser aquela a “última rodada” de verdade e o que me quebrou foi um momento que um frequentador, ao se despedir da dona do bar já com o sol raiando, pergunta a ela onde eles agora vão se encontrar todas as noites.
Ela só sorri e nada diz.
O filme mostra a dona e barwoman tendo que lidar com os bêbados, os doidões, os que estão caindo, os que já caíram uma última vez, revezando o atendimento com seu companheiro que já trabalhou o primeiro turno.
O 20’s, o bar do filme, é daqueles que abre cedo e só fecho quando estiver cedo de novo. Todo dia. Sem falta.
É daqueles lugares que as pessoas vão e ficam.
O ex-ator que não tem onde morar vai com suas várias sacolas, guarda no canto, bebe até cair e cai em um dos sofás do bar até que alguém o acorde e ele sai com raiva porque vai ter que ficar na rua até que o bar abra de novo.
Ou o veterano de guerra vai para uns drinques antes de ir trabalhar, onde conta as mesmas histórias tristes e mostra as mesmas cicatrizes todos os dias. Sem falta. E de lá só sai quando alguém do seu trabalho liga no bar e pede para que o dono mande o ex soldado ir trabalhar. Ao que ele pergunta onde trabalha.
Ou o cara que vai ao bar para arrumar encrenca, para provocar. Quanto mais bebe mais se exalta, dizendo que quer brigar mas não tem força pra levantar o braço para bater em ninguém.
O 20’s é, ou foi, aquele tipo de lugar que você se sente em casa mesmo com as pequenas grosserias das donas.
É aquele porto seguro que mesmo para alguém que não bebe como eu, sabia que indo lá daria risada, encontraria um monte de gente conhecida, me divertiria, conversaria, me perderia e passaria momentos que de alguma forma melhorariam os meus dias.
Mas o 20’s era na verdade aquele boteco de fim de carreira, com todas essas vantagens de intimidade e acolhimento ao mesmo tempo que o lugar onde você se enxergaria em 5 ou 10 anos no auge de sua decadência.
Ah, os paradoxos.
É como o ex-ator diz para um pseudo músico que lá está: eu tenho 62 anos, pareço que tenho 80 e se você não quiser terminar como eu, saia daqui e não entre no próximo bar. Nem no próximo. E com certeza não no próximo.
Conselho bom a gente segue. E por sorte veio num filme melhor que esse conselho ainda.
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Depois de tudo isso, de assistir, me emocionar e ter boas lembranças por causa do filme, fui procurar saber dos diretores e descobri que Bloody Nose, Empty Pocket é um pseudo documentário, como os irmãos Bill Ross IV e Turner Ross chamam seu filme.
Eles tiveram a ideia do filme e foram atrás de frequentadores de bar assíduos pelos EUA e os levaram para uma locação em New Orleans e lá fizeram o filme, sem roteiro, só com ideias de diálogos, tudo filmado em 2 diárias de 18 horas, o que deixa tudo mais interessante ainda.
Os caras fizeram uma ficção em cima de cenas documentais ficcionais ou o contrário, fizeram um documentário em cima de cenas de ficção criadas a partir da vida real.
De uma forma ou de outra, o filme é brilhante.
NOTA: