Se fosse uma tese de doutorado, You Don’t Nomi levaria 10, sairia com livro publicado e documentário produzido.
Seu autor, Jeffrey McHale, resolveu pular fases e produziu esse ótimo documentário, quase nóia, sobre um dos piores filmes de todos os tempos, o clássico kitsch sexista Showgirls.
Pra quem é jovem demais ou por algum outro motivo escuso não conhece Showgirls, o filme de 1995 do diretor holandês Paul Verhoeven, queridinho de Hollywood da época, foi uma das maiores catástrofes do cinema americano de todos os tempos.
Já disse que o filme é sexista e brega, mas além de tudo é muito ruim como cinema.
Verhoeven estava no auge de sua carreira por causa de Instinto Selvagem, que roubou a atenção de tudo e de todos em seu lançamento no Festival de Cannes em 1992, onde eu estava, minha primeira sessão em Cannes, filme de abertura do Festival, com a polêmica cena da cruzada de pernas sem calcinha da personagem de Sharon Stone, pra quem eu perguntei sobre isso na coletiva e levei uma resposta bem fofa na hora mas que depois, ao encontrar com a atriz no Palais du Festival, ela me reconheceu e veio me dizer que não esperava que alguém perguntasse algo assim pra ela.
O quê? Vou contar a historinha no episódio 7 do Já Ouviu?, meu podcast, semana que vem no ar, mas que dá pra ouvir os primeiros episódios aqui.
Bom, Verhoeven saiu aclamado de Cannes, o filme estourou nas bilheterias do mundo todo, Sharon virou A atriz e o resto é história.
Mas não para Showgirls, o próximo projeto do diretor holandês junto com o roteirista de Instinto Selvagem, Joe Eszterhaz.
O filme sobre uma dançarina que quer ser famosa em Las Vegas e faz de tudo para conseguir alcançar seu sonho é um absurdo, quase uma bíblia do que não fazer na vida profissional, ou um guia de como ser uma pessoa desgraçada e odiada por todos em seu ambiente de trabalho, embalado por uma capa cafona e machista que até para os moldes dos anos 1990 foi demais.
O filme foi tão detonado (com razão) que deu pena.
E quem sofreu demais com isso não foi o holandês doido, claro, foi sua estrela Elizabeth Berkley, a Nomi do filme, a Nomi do título desse documentário.
Bom, o filme com o tempo foi ganhando um culto de adoradores irascíveis, que o defendem com unhas e dentes e a prova é esse documentário, que analisa tudo minuciosamente, achando (vários) pelos em casca de ovo.
Os gays amam Nomi, a menina do interior que vai do inferno ao paraíso e de volta ao inferno na Las Vegas do sexo e drogas e muitas plumas e paetês, transformando o filme em musical de teatro, em shows de drags, em razão de encontros ao vivo e de adoração a Elizabeth, algo que ela só foi ter por isso mesmo, tarde na vida.
Se você fizer como eu fiz e não levar You Don’t Nomi tão a sério, um filme que tenta provar que um grande trash hollywoodiano é na verdade arte, vai se divertir muito.
NOTA: