por Gabriel Correia
Adaptações cinematográficas, por mais complicadas que possam ser, colocam o realizador numa posição cômoda de arriscar sem que o ônus do fracasso, caso ele venha, seja exclusivamente seu. Arrisco dizer que é mais complicado trabalhar a partir de uma obra já existente do que partir do zero, isso porque um filme adaptado de outras mídias sempre carrega contra si o peso da obra no qual se baseia. Se é uma obra canônica, consagrada ou simplesmente de forte apelo popular sempre pesará contra o filme, salvo raras exceções o status de obra menor, de caráter oportunista. Caso contrário, em adaptações de obras obscuras, ignoradas ou aviltadas por crítica e público, a lógica se inverte e as analises tendem a ser mais complacentes. Em todo caso, o filme adaptado nunca terá o mérito inteiramente pra si, o que é ruim, mas também nunca poderá ser encarado como o responsável único pelo próprio fracasso. Faroeste Caboclo, de René Sampaio, é um filme adaptado de uma letra de música que bebe em um milhão de referências, do cinema western à literatura de cordel, temperadas com uma atmosfera beat tão cara a seu autor, Renato Russo. É difícil analisar o filme sem ter em mente a letra da canção, e assim sendo fica fácil criticá-lo quanto a escolhas equivocadas de enredo e construção de personagens. A história, no filme, não flui, João, Maria Lúcia e Jeremias são vítimas de uma tentativa mal executada de transpor para o cinema a narrativa fragmentada e concentrada da letra. Assim, os personagens se tornam rasos, uma vez que não há tempo fílmico para que se desenvolvam plenamente e a trama se banaliza com ações que não se justificam e só servem para que o diálogo com a história da canção se estabeleça. Faroeste Caboclo, em sua opção por se ligar em demasia ao enredo da letra no qual se baseia opta pelo caminho mais fácil em uma seara onde não existem caminhos fáceis e isso o enfraquece, uma vez que arriscar trabalhar com outros rumos dentro do processo de adaptação seria tão complicado quanto se apegar com afinco à narrativa base. Se João não tem medo, aqui o cineasta tem por ele.
Coluna publicada originalmente na versão impressa do Jornal Primeira Página de São Carlos em 21 de Junho de 2013.
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