por Gabriel Correia
Escrevi há algumas semanas sobre o quão complicado são as adaptações cinematográficas, cravadas que estão no cerne de discussões extremamente subjetivas sobre obras originais e derivadas. Ao discorrer sobre tal questão, tomei como exemplo o filme Faroeste Caboclo e opinei que seu ponto fraco era justamente a falta de ousadia ao optar por uma adaptação o mais fiel possível ao enredo da letra da canção da qual era derivado. Não é o caso de uma simples dicotomia que colocaria de um lado obras de menor qualidade, pois fiéis aos textos nos quais se baseiam, e obras mais qualificadas, pois suficientemente ousadas ao abordarem o texto base de maneira mais livre. A discussão é bem mais profunda e deve levar em considerações outras categorias de relações entre os textos literários e audiovisuais como o “inspirado em” e o “baseado em”. Contos do Edgar é uma série que trabalha no limite entre essas categorias. Produzida pela O2 Filmes e exibida no Canal Fox, a série se inspira, ou adapta livremente se quiserem, em obras clássicas de Edgar Allan Poe como os contos Berenice, O Gato Preto, Metzengerstein, entre outros, além de evocar elementos da vida do autor norte-americano e de seu poema mais célebre, O Corvo. E é no amálgama desses contos, poema e trajetória pessoal de Poe que reside o diferencial desse trabalho de adaptação, mais até do que a atualização espaço-temporal realizada ao transpor as histórias originais para a São Paulo contemporânea. O fio condutor que une os 5 episódios da primeira temporada da série é o exterminador de pragas Edgar que orbita e atravessa a vida dos personagens que vivem na tela versões atualizadas e modificadas das histórias de Poe. A série, assim, desenvolve-se numa estrutura episódica unitária mesclada com uma seriada clássica, na qual cada episódio conta uma história diferente e há uma unidade de personagens, espaço e tema. Das recentes séries nacionais, advindas do incentivo que a Lei 12.485 estabelece, Contos do Edgard é das mais bem acabadas, tanto formalmente quanto temática e narrativamente. O que comprova que material adaptado pode sim ser rico e diferenciado.
Coluna publicada originalmente na versão impressa do Jornal Primeira Página de São Carlos em 5 de Julho de 2013.
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